A discussão sobre a retirada da Guarda Municipal de centros de saúde em Belo Horizonte, que quase resultou em uma paralisação de servidores da saúde, trouxe à tona uma dúvida comum para muitos brasileiros.
Afinal, qual é o verdadeiro papel desse tipo de corporação? A Guarda Municipal pode atuar como polícia, realizar abordagens e efetuar prisões? A resposta não é simples e envolve a Constituição, leis específicas e decisões recentes dos tribunais superiores.
O debate sobre as atribuições das guardas municipais é constante e costuma ganhar força em momentos de crise na segurança pública.
Enquanto alguns defendem uma atuação mais restrita, focada na proteção do patrimônio, outros veem na corporação uma força auxiliar essencial para a segurança das cidades.
O que diz a Constituição sobre a segurança pública?
A base para a organização da segurança no Brasil está no artigo 144 da Constituição Federal.
O texto estabelece que a segurança pública é dever do Estado e um direito de todos, sendo exercida por órgãos específicos.
A lista inclui a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, a Polícia Ferroviária Federal, as Polícias Civis e as Polícias Militares, além dos corpos de bombeiros militares.
As guardas municipais também são mencionadas no mesmo artigo. No entanto, sua função é descrita de forma mais específica: a proteção dos bens, serviços e instalações do município.
Essa redação original gerou, por anos, a interpretação de que o papel da guarda era estritamente patrimonial, sem poder de polícia ostensiva, função essa designada às Polícias Militares.
Essa divisão de tarefas é o ponto central da discussão. A Polícia Militar tem a responsabilidade pelo policiamento ostensivo e pela preservação da ordem pública.
Já a Polícia Civil atua na investigação de crimes e como polícia judiciária. As guardas, por sua vez, teriam um papel preventivo e focado no patrimônio municipal.
As atribuições definidas pelo Estatuto da Guarda Municipal
Para detalhar e padronizar a atuação das guardas em todo o país, foi sancionada em 2014 a Lei 13.022, conhecida como o Estatuto Geral das Guardas Municipais.
A legislação expandiu a visão sobre o papel da corporação, definindo-a como uma instituição de caráter civil, uniformizada e armada, com função de proteção municipal preventiva.
O estatuto lista uma série de competências que vão além da simples vigilância de prédios públicos. Entre as principais atribuições, estão:
- Zelar pelos bens, equipamentos e prédios públicos do município.
- Prevenir e inibir, pela presença e vigilância, infrações penais ou administrativas que atentem contra os bens, serviços e instalações municipais.
- Atuar, preventiva e permanentemente, no território do município para a proteção da população que utiliza os bens, serviços e instalações municipais.
- Colaborar com os órgãos de segurança pública em ações conjuntas.
- Interagir com a sociedade civil para discussão de soluções de problemas e projetos locais voltados à melhoria das condições de segurança.
- Encaminhar ao delegado de polícia, diante de flagrante delito, o autor da infração, preservando o local do crime.
- Auxiliar na segurança de grandes eventos e na proteção de autoridades e dignatários.
- Atuar na fiscalização e controle do trânsito municipal.
Decisões recentes do STF e o poder de polícia
Apesar do que diz a lei, a questão sobre a guarda municipal poder ou não agir como polícia continuou a ser debatida nos tribunais.
A controvérsia principal girava em torno da validade de provas obtidas em abordagens e buscas pessoais realizadas por guardas municipais.
Em 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão importante sobre o tema. O tribunal reconheceu que as guardas municipais integram o Sistema Único de Segurança Pública (Susp).
Com isso, foi validada a sua competência para realizar patrulhamentos preventivos, abordagens e prisões em flagrante delito dentro do território do município.
Na prática, a decisão do STF não transforma a guarda municipal em uma polícia com as mesmas atribuições da PM ou da Civil. Sua função principal continua sendo a proteção municipal preventiva.
Contudo, a decisão fortalece sua legitimidade para atuar em situações de flagrante, como um roubo em uma praça pública ou tráfico de drogas perto de uma escola municipal.
Isso significa que um guarda municipal pode, sim, realizar uma abordagem se houver fundada suspeita de um crime.
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Ele pode efetuar a prisão em flagrante e conduzir o suspeito à delegacia de Polícia Civil, que é a autoridade responsável por formalizar o ato e iniciar a investigação.
A atuação da guarda, nesse contexto, é vista como complementar à das outras forças policiais.

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