A rede de esgoto que passa sob a sua rua é uma parte essencial da infraestrutura urbana, mas pode esconder ameaças invisíveis à saúde. Quando o saneamento básico é inadequado ou falha, o contato direto ou indireto com água contaminada por dejetos humanos e de animais se torna um risco real, abrindo portas para uma série de doenças graves que afetam milhares de pessoas todos os anos no Brasil.
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O perigo não se limita a áreas sem qualquer tipo de tratamento. Vazamentos, refluxos durante enchentes e ligações clandestinas podem contaminar o solo, a água de poços e até mesmo a água que chega às torneiras. Entender quais são essas doenças e como elas se propagam é o primeiro passo para proteger sua família e cobrar ações efetivas do poder público.
Leptospirose
Causada pela bactéria Leptospira, a leptospirose é frequentemente associada a enchentes e alagamentos. A urina de ratos, principal portador da bactéria, contamina a água e a lama do esgoto. O simples contato da pele com essa água, especialmente se houver algum ferimento ou arranhão, pode levar à infecção.
Os sintomas iniciais são parecidos com os de uma gripe forte: febre alta, dor de cabeça e dores musculares, principalmente nas panturrilhas. Em casos mais graves, a doença evolui para a forma ictérica, conhecida como Síndrome de Weil, que causa icterícia (pele e olhos amarelados), insuficiência renal e hemorragias, podendo ser fatal.
Cólera
A cólera é uma infecção intestinal aguda causada pela ingestão de água ou alimentos contaminados pela bactéria Vibrio cholerae. Essa bactéria se prolifera em ambientes com saneamento precário, sendo o esgoto a céu aberto um dos principais focos de disseminação. O microrganismo é liberado nas fezes de pessoas infectadas e pode contaminar rapidamente fontes de água.
A doença se manifesta de forma súbita, com diarreia aquosa e intensa, vômitos e cãibras. A perda rápida de líquidos corporais leva à desidratação severa, que, se não for tratada imediatamente com reidratação oral ou venosa, pode causar choque e morte em questão de horas. A prevenção depende diretamente do acesso à água tratada e do descarte correto do esgoto.
Hepatite A
Esta é uma inflamação do fígado causada pelo vírus da hepatite A (VHA). A transmissão ocorre pela via fecal-oral, principalmente pelo consumo de água ou alimentos contaminados por esgoto. O vírus é muito resistente e pode sobreviver por meses no ambiente, tornando a falta de saneamento um fator de risco constante.
Os sintomas incluem fadiga, náuseas, vômitos, dor abdominal, febre e icterícia. Diferente das hepatites B e C, a hepatite A não se torna crônica, mas pode causar uma doença debilitante que dura várias semanas. A vacinação é a forma mais eficaz de prevenção, juntamente com a melhoria das condições de higiene e saneamento.
Febre tifoide
Causada pela bactéria Salmonella typhi, a febre tifoide também está ligada ao consumo de água e alimentos contaminados por fezes humanas. A bactéria pode sobreviver por semanas na água ou no esgoto, representando um perigo contínuo em locais com infraestrutura sanitária deficiente.
Os sintomas se desenvolvem gradualmente e incluem febre alta e prolongada, dor de cabeça, mal-estar geral, tosse seca e manchas rosadas no tronco. Se não tratada com antibióticos, a doença pode levar a complicações graves, como hemorragia intestinal, perfuração do intestino e até a morte.
Giardíase
A giardíase é uma infecção intestinal causada pelo protozoário Giardia lamblia. A contaminação acontece pela ingestão de cistos do parasita, que são eliminados nas fezes de pessoas ou animais infectados e podem contaminar redes de água e esgoto. É uma das causas mais comuns de doenças diarreicas em todo o mundo.
Os sintomas mais frequentes são diarreia, gases, cólicas abdominais, náuseas e perda de peso. Embora muitas vezes seja autolimitada, a infecção pode se tornar crônica, especialmente em crianças, levando à síndrome de má absorção e desnutrição. O tratamento adequado da água é fundamental para o controle.
Amebíase
Outra doença causada por um protozoário, a Entamoeba histolytica, a amebíase é transmitida da mesma forma que a giardíase: pela ingestão de cistos presentes em água e alimentos contaminados por fezes. A falta de tratamento de esgoto permite que o parasita se espalhe facilmente pela comunidade.
Na maioria dos casos, a infecção é assintomática. Quando os sintomas aparecem, podem variar de um desconforto abdominal leve com diarreia a uma disenteria grave, com fezes sanguinolentas e cólicas intensas. Em casos raros, o parasita pode invadir outros órgãos, como o fígado, causando abcessos que exigem tratamento imediato.
Esquistossomose
Conhecida popularmente como “barriga d’água”, a esquistossomose é causada pelo verme Schistosoma mansoni. O ciclo da doença envolve caramujos de água doce que liberam larvas do verme. O esgoto não tratado contamina rios e lagos, permitindo que os ovos do parasita, presentes nas fezes humanas, infectem os caramujos.
A infecção ocorre quando a pele entra em contato com a água contaminada por essas larvas. A fase aguda pode causar febre, dores de cabeça e calafrios. Na fase crônica, os vermes se alojam nos vasos do intestino e do fígado, podendo causar fibrose hepática, hipertensão portal e aumento do baço, quadro que caracteriza a “barriga d’água”.

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